Hoje eu tenho 26 anos e
há 16 anos o dia dos pais deixou de ser motivo de festa para ser um dia de
lembranças. É estranho, mas dias antes dessa data eu andei pelas ruas olhando
presentes e pensando o que eu compraria, o que o meu pai gostaria de ganhar...
consigo imaginar e até ouvir o que ele falaria quando recebesse meu presente,
sempre reclamando sobre o quanto eu tinha gastado e terminando a “reclamação”
com um abraço e um sorriso.
O meu pai era um homem
do campo, daqueles que nunca ficava na cama depois das 5h da manhã. As 7h da
manhã ele já estava de volta do “primeiro turno” do trabalho. Sentava na mesa
para o café e enquanto a minha mãe me mandava tomar banho antes de ir pro
colégio ele, que estava sentado na mesa, me colocava no colo e me agarrava
dizendo pra minha mãe que eu não ia tomar banho pq tinha acordado muito
cheirosa. E ali, no colo dele, eu escapava do banho e qualquer outra bronca que
a mãe insistia em me dar.
Terminava o café e ele
saía pra trabalhar de novo, mas antes me repetia a frase de sempre: “Presta bem
atenção na aula, estuda muito pra ser a minha doutora”.
Depois disso eu só
encontrava meu pai no fim da tarde, quando ele chegava em casa e me colocava no
colo dele na rede ou na cadeira de balanço. Interessante que por mais que ele
me mandasse estudar ele nunca me perguntava como tinha sido a aula, ou se eu
tinha temas para fazer. Quando o meu pai chegava em casa ele só me perguntava
do que eu tinha brincado, com quem eu brinquei, o quanto eu me diverti, e se
alguém tinha me incomodado, pq se alguém me incomodasse ele “ia dar um jeito
nisso”. Hahahaha
Eu tinha um super
herói, e por isso eu me sentia super protegida. Não importa o que acontecesse,
o meu pai sempre ia dar um jeito, ele sempre ia me proteger.
Nós éramos cúmplices e
confidentes. Comigo ele podia comer tudo que todos proibiam ele... e esse era o
“nosso segredo”. As tantas coisas que eu fazia escondido da minha mãe, ele
sempre ficava sabendo, e ainda ria dizendo o quanto eu era esperta. Lembro bem
do dia em que contei pra ele que todos os dias eu tomava banho pelada na
cachoeira, pra não molhar a roupa e a mãe não descobrir... Ele riu muito e me
disse “ela nunca vai desconfiar disso,
pode continuar. Onde já se viu proibir meu peixinho de nadar?”
Sempre que eu ficava
doente, ou com uma dorzinha qualquer, o meu pai deitava comigo num quarto
escuro, me pedia pra respirar fundo fechar os olhinhos e só pensar em coisas
boas...
As pessoas que
conviveram com a gente tem um pouco de noção do quanto nós éramos ligados, do
quanto pertencíamos um ao outro, e do quanto eu sofri quando ele se foi. Mas só
eu e ele sabemos de fato o quanto o nosso laço era forte, só eu sei o quanto
doeu não acordar todos os dias com ele chamando, o quanto doeu não ter ele pra
me colocar na cama, não ter pra quem contar tudo de legal que eu tinha feito no
meu dia. Doeu de um jeito que parecia que não ia passar nunca. Mas passou... A
dor foi se desfazendo e deixando só a saudade tomar conta... E com a saudade eu
aprendi a conviver.
É uma saudade boa pq me
faz lembrar que eu tive o melhor pai que eu poderia ter. É uma saudade que me
faz sentir orgulho de ser filha daquele homem, de carregar o nome dele, de
contar suas histórias, as nossas histórias. É uma saudade que me faz sorrir com
cada lembrança. Uma saudade que é amenizada naqueles sonhos que me fazem ter
certeza que ele nunca me deixou, que ele acompanha tudo que eu faço, e que de
alguma forma ele ainda cuida de mim.
Mas essa saudade às
vezes vira nó na garganta, e num “dia dos pais”, por mais que passe o dia
tentando abstrair o significado disso, esse nó na garganta me faz companhia...
até que chega a hora de dormir e as lágrimas escapam. Eu choro calada e me
culpo pq eu deveria ser mais forte. Um nó começa a apertar na garganta e no
coração, e dói... Como faz pra amenizar essa dor? Segue a receita do pai:
“Respira
fundo, fecha os olhinhos e pensa em coisas boas”
E assim eu dormi,
pensando em todas as coisas boas que eu vivi com ele!
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